O primeiro Banco do Brasil
Imagem acima: Foto da antiga Rua Direita (atual 1° de Março) no Rio de Janeiro, tirada por volta de 1860. O prédio em primeiro plano foi, no século XVII, a Casa dos Governadores, passando seguidamente à “Casa dos Contos”. De 1815 a 1835 abrigou a sede do 1° Banco do Brasil. Em 1870, foi demolido para dar lugar ao edifício construído pela Associação Comercial para abrigar a terceira Praça do Comércio do Rio de Janeiro. No local funcionaram, de 1906 até início dos anos vinte, a terceira Praça do Comércio e a “Bolsa de Fundos Públicos do Rio de Janeiro” (Bolsa de Valores). Em 1926, o Banco do Brasil instalou nele sua sede. Atualmente, o prédio abriga o Centro Cultural do Banco do Brasil no Rio de Janeiro (CCBB/RJ).
O Banco do Brasil tem a particularidade de se mostrar presente a cada vez que o país enfrenta crises e momentos cruciais. Foi assim quando o Príncipe Regente D. João assinou o Alvará que o fundou — o Brasil experimentava um momento histórico que do ponto de vista econômico costuma ser comparado com o que representou a Independência política, ocorrida quatorze anos mais tarde. Foi também assim quando, graças à visão de estadista do Visconde de Itaboraí, ex-primeiro Ministro, ex-Ministro da Fazenda e presidente do Banco do Brasil, ocorreu o que se pode considerar sua “segunda fundação”, num instante em que o Império superava os tempos críticos da pós-independência e o conturbado período regencial, e inaugurava uma fase de grande dinamismo econômico.
Quando o Príncipe D. João — recém-chegado ao Brasil obrigado a deixar repentinamente a Metrópole invadida pelas tropas de Napoleão — decidiu criar, em 1808, o Banco do Brasil, existiam apenas três bancos emissores no mundo (na Suécia, na França e na Inglaterra). As condições, afinal, apontavam para essa necessidade:
1. O processo de mineração entrava em declínio.
2. Era grande a escassez de moedas.
3. Tanto a intensificação das atividades comerciais, com a abertura dos portos, quanto as despesas com a Família Real e sua corte exigiam aumento do numerário existente.
A criação do Banco do Brasil foi então determinada por um Alvará do Príncipe Regente D. João, expedido no Rio de Janeiro em 12 de Outubro de 1808. Antes, operavam no setor de crédito apenas alguns capitalistas nacionais e ingleses, recentemente estabelecidos, que sacavam sobre as praças européias e recebiam dinheiro em conta corrente ou depósito, na maior parte das vezes para passá-lo aos bancos da Inglaterra ou convertê-lo em títulos de renda assegurada. Essas somas eram sempre entregues em ouro e exportadas como mercadorias.
No mesmo ano, por Decreto de 3 de Setembro, foi iniciada a emissão dos “escritos da Alfândega”, conhecidos mais tarde por “bilhetes”, que eram dados como pagamento nas estações públicas.
Precursores dos “bilhetes ou notas de bancos”, os escritos abriam caminho ao papel-moeda do Tesouro Nacional. Existia também o “Cofre de Depósito”, confiado à Câmara; servia tanto para depósitos judiciais como para a tranquilidade dos particulares que buscavam segurança para seus capitais, preferindo deixá-los inativos. Para os empréstimos a juros recorria-se ao Cofre dos Órgãos, às Ordens Terceiras e à Casa de Misericórdia, que até o século seguinte, ainda serviria de casa sacadora e repassadora de capitais para a Europa, Ásia, e África*.
Nota: *Em Março e Abril de 1893, o Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, publicou, sem revelar a autoria, uma história do Banco do Brasil, bem fundada, à luz da proximidade dos fatos e, presumivelmente, de documentos que, em boa parte, não foram conservados. Utilizamos, por isso, essa fonte. A presente nota refere-se à edição de 26 de março de 1893.
O Alvará de 12 de Outubro de 1808
“Eu, o príncipe regente, faço saber aos que este meu alvará com força de lei virem: que atendendo a não permitirem as atuais circunstâncias do Estado, que o meu Real Erário possa realizar os fundos, de que depende a manutenção da Monarquia e o bem comum dos meus fiéis vassalos, sem as delongas que as diferentes partes, em que se acham, fazem necessárias para a sua efetiva entrada; a que os bilhetes dos direitos das Alfândegas tendo certos prazos nos seus pagamentos, ainda sejam de um crédito estabelecidos, não são próprios para o pagamento, ainda sejam de um crédito estabelecido, não são próprios para o pagamento de soldos, ordenados, juros e pensões, que constituem os alimentos do corpo político do Estado, os quais devem ser pagos nos seus vencimentos em moeda corrente; e a que os obstáculos, que a falta de giro dos signos representativos dos valores põem ao comércio, devem o quanto antes ser removidos, animando e promovendo as transações mercantis dos negociantes desta e das mais praças dos meus domínios, e senhorios com as estrangeiras.”
Em seguida, a principal parte dispositiva do Alvará: “Sou servido ordenar que nesta capital se estabeleça um Banco Público, que na forma dos Estatutos, que este baixam, assinados por Dom Fernando José de Portugal, do meu Conselho de Estado, ministro Assistente ao Despacho do Gabinete, presidente do Real Erário e secretário de Estado dos Negócios do Brasil, ponham em ação os cômputos estagnados, assim em gêneros comerciais, como em espécies; Cunhadas; promova a indústria nacional pelo giro, e combinação dos capitais isolados, e facilite juntamente aos meios, e aos recursos, de que as minhas rendas reais e as públicas necessitarem para ocorrer às despesas do Estado.”
O principal objetivo da fundação do Banco, evidenciava não só a prioridade como a insistência com que era destacado na introdução do Alvará: proporcionar, com urgência, fundos para a manutenção da cúpula monárquica, composta principalmente pela rainha, D. Maria I, pelo Príncipe Regente, sua esposa D. Carlota Joaquina, prole, parentes próximos e afastados e pelo numeroso conjunto de fidalguia, administração e serventia doméstica.
O documento extinguia o Cofre do Depósito e definia, entre outras vantagens, a remuneração dos dirigentes do Banco:
“Em todos os pagamentos que se fizerem à minha Real Fazenda, serão contemplados e recebidos como dinheiro os bilhetes do dito Banco Público pagáveis ao portador ou mostrados à vista e da mesma forma se distribuirão pelo Erário Régio nos pagamentos das despesas do Estado: e ordeno que os membros da junta do Banco e os diretores dele sejam contemplados pelos seus serviços com as remunerações estabelecidas para os Ministros e oficiais da minha Real Fazenda e administração da justiça, e gozem de todos os privilégios concedidos aos deputados da Real Junta do Comércio.”
Os estatutos que vinham em anexo ao Alvará, extensos e minuciosos, desdobravam- se em providências para a organização do Banco e suas operações. O estabelecimento era denominado Banco do Brasil e a duração de seus privilégios estava fixada em 20 (vinte) anos, findos os quais, ou se dissolveria, ou novamente se constituiria, se o governo assim entendesse. O capital inicial era de 1.200 contos de réis, dividido em 1.200 ações de um conto de réis cada uma, podendo ser aumentado através de novas ações. O giro poderia ser iniciado logo que houvesse em caixa 100 (cem) ações. Era proibida e nula toda penhora ou execução, fiscal ou civil, sobre ações do Banco, e os acionistas podiam ser nacionais ou estrangeiros.
As operações do Banco consistiam:
1. No desconto mercantil de letras de câmbio, sacadas ou aceitas por negociantes de crédito, nacionais ou estrangeiros.
2. Na comissão dos cômputos arrecadados de particulares ou estabelecimentos públicos, ou adiantados através de hipotecas.
3. No depósito geral em prata, ouro, diamantes ou dinheiro.
4. Na emissão de letras ou bilhetes pagáveis ao portador, no mínimo de 30 mil réis.
5. Na comissão dos saques particulares ou do Real Erário, de fundos localizados no estrangeiro ou nacional, em área remota.
6. No recebimento de toda a soma, que se lhe oferecesse aos juros da lei.
7. Na comissão da venda dos gêneros privativos dos contratos e administração reais, como os diamantes, pau-brasil, marfim e urzela.
8. No comércio das espécies de ouro e prata.
O Banco não podia descontar ou receber, por comissão ou prêmio, frutos de operações que pudessem ser consideradas contrárias à segurança do Estado, assim como de contrabando ou de transações suspeitas. Sua assembléia geral era integrada por 40 dos seus maiores acionistas; a junta, por 10; e a diretoria, por 4 acionistas. A cada ano a assembléia elegia 5 novos deputados da junta e 2 diretores, sendo permitida a reeleição. Os integrantes da assembléia geral deviam ser portugueses, mas qualquer cidadão português que mostrasse procuração de um estrangeiro incluído entre os maiores capitalistas, poderia ingressar e representá-lo.
Para o direito a voto nas sessões do Banco, exigia-se que o acionista tivesse o mínimo de 5 (cinco) ações, e a cada lote com esse número de ações o acionista podia exercer o direito a mais um voto, até o limite de 4 (quatro); se dois ou mais possuíssem juntos 5 (cinco) ações, podia um deles ter voto, por procuração. Cabia à junta administrar os fundos e, aos quatro diretores, fiscalizar as transações e operações do Banco, em geral. Todas as decisões se faziam pela pluralidade dos votos e os casos de empate eram decididos na assembléia geral.
A idéia da criação de um Banco de Estado, segundo o historiador Afonso Arinos de Mello Franco, já era familiar nos meios administrativos portugueses alguns anos antes da fundação do Banco do Brasil. Ele assinala que:
“como tantas, se não todas as ideias que implicavam em progresso político e econômico, com utilização, no velho reino, de novos processos governativos, veio ela do estrangeiro e foi um estrangeiro o primeiro a agitá-la em Portugal: o italiano Domingos Vandelli”.
Arinos refere-se às origens e andanças de Vandelli, aos seus escritos, publicados ou inéditos e a dois projetos que elaborou para a criação de um Banco Nacional, destinado a suprir o governo de numerário, e que datam, seguramente, de fins do século XVIII.
A criação de um Banco de Depósitos e de Circulação podia ser útil ao Brasil no momento em que a abertura dos portos tornava os negócios mais ou menos ativos, os produtos da agricultura chegavam em abundância e vinham fornecer carregamento aos navios que começavam a entrar sob todas as bandeiras. Havia necessidade de um volume maior do agente intermediário das permutações: assim é que os bilhetes do Banco entraram facilmente em circulação, preenchendo um vazio no comércio do país. A moeda de 960 réis não deixou de circular ainda por muito tempo ao lado desses bilhetes.
Todavia, o desenvolvimento dos portos e dos mercados de produtos agrícolas foi, na verdade, lento e difícil. O próprio Banco enfrentou, inicialmente, dois problemas bastante interligados: a demora na captação do capital e o seu funcionamento. Apesar das facilidades concedidas, somente em 11 de Dezembro de 1809 (mais de um ano depois da sua fundação), começou a funcionar, assim mesmo com apenas 1/10 do seu capital que, três anos após, ainda não excedia 126:000$0004.
Em razão desse quadro, o governo resolveu adotar novas medidas em favor do estabelecimento, publicando o Alvará, de 20 de Outubro de 1812, ordenando que a Real Fazenda entrasse como acionista, destinando para isso, pelo período de 10 (dez) anos consecutivos, a arrecadação de antigos e novos impostos, e abrindo mão, durante cinco anos, de qualquer lucro resultante das suas ações.
O lançamento do “imposto do Banco”, como ficou conhecido, era feito no Rio de Janeiro e em todas as Capitanias, e era de 12$000 Réis anuais sobre comércio, indústrias e profissões. Ficavam isentas as lojas, botequins e tavernas estabelecidas nas estradas, arraiais e capelas, e nas pequenas povoações em que não houvesse magistratura de “vara branca”. O capital do Banco consolidou-se através dessa arrecadação e, posteriormente, pela própria fluência de capital particular. Desses impostos entraram para os cofres do Banco 576:000$000, correspondentes a 576 ações, sendo 500:000$000 nos primeiros cinco anos, de 1813 a 1817 e 76:000$000 entre 1818 e 1822. De 1813 em diante cresceu de tal forma a subscrição de ações que, em 1829, o total chegou a 3.600. Quando, no mesmo ano, extinguiu-se o Banco, o Tesouro possuía apenas 80 ações. As 3.520 restantes eram de particulares.
APOGEU E QUEDA
Uma das medidas que mais contribuíram para esse crescimento foi a concessão de títulos e comendas aos capitalistas que subscrevessem ações. Várias pessoas, inclusive, chegaram a passar por grandes provações para alimentar essa vaidade, tomando dinheiro emprestado a juros altos para adquirir as ações, que não conseguiam vender depois de receber as condecorações”. (Jornal do Commercio, edição de 26 de Março de 1893).
“A falta de uma administração competente e zelosa e o excesso de emissões foram as duas causas principais do fracasso do Banco na fase de sua primeira fundação. “A administração do Banco nunca primou por acertada e prudente, espalhando-se por vezes boatos tais de malversações e extravios de dinheiro, que o governo viu-se forçado, não a proceder a rigoroso inquérito, como aconselhava a salvação do estabelecimento, mas a impor silêncio pela violência aos que davam curso àqueles boatos”, relatou o conselheiro Pereira da Silva, no livro História da Fundação do Império.
Ao narrar este fato, Pereira da Silva diz que o Correio Braziliense acusou o governo sem levantar provas. No entanto, tudo indica que Hipólito José da Costa, o responsável pela edição do jornal, não faltou com a verdade. O conselheiro José Antonio Lisboa, no livro Reflexões sobre o Banco do Brasil, publicado em 1821, referindo-se aos perigos que correra o estabelecimento em 1817, diz ter sido público “nesta cidade, que Francisco José dos Santos, negociante desta praça, e José da Rosa Salgado, que exercia o emprego de corretor, teriam sido presos, o primeiro na cadeia, e o segundo na Ilha das Cobras, em consequência de denúncia que se deu contra eles por falarem do mau uso que se fazia dos fundos do Banco e das prevaricações de seus empregados”.
Em 1827, o Marquês de Queluz afirmou, no relatório da Fazenda, que o Banco do Brasil era um estabelecimento de que se poderia tirar vantagens se estivesse em outras mãos e com outros métodos, mas que, mal administrado como fora, só ocasionaria os estorvos administrativos em que se achava o governo. “Pelas dilapidações públicas da sua administração, logo nos princípios dela”, relatou, “sabermos que o Banco esteve abismado e que só a influência e socorros do governo o levantaram e o restabeleceram”.
Nas análises realizadas por ordem do governo e constantes de documentos que ainda há poucos anos existiam no Tesouro, reconheceu-se que a escrituração do Banco foi sempre irregular, principalmente a especial da caixa. No período de 1817 a 1821, ocorreram transações sem escrituração, como o desconto de letras pelo dinheiro da caixa do troco das notas em metal, e foram descobertos desfalques em diversas caixas, dos quais o mais alto foi de 761:201$491, que no balanço de 31 de julho de 1828 figura como quantia extraviada.
O mesmo tipo de abuso ocorreu no sistema de emissão. Os desvios foram facilitados pelo segredo que cercava as operações, e os acionistas não os ignoravam. Em 1823, eles rejeitaram medidas propostas por Gervásio Pires Ferreira, possuidor de 40 ações, conforme relatou o Ministro da Fazenda Bernardo de Souza Franco:
“Se alguma era intempestiva, como a cessação total de empréstimos ao Tesouro e exigência de prestação fixa para pagamento da dívida anterior e seus juros, não se podia desconhecer a indispensabilidade das que tinham, por fim, melhor regular a escolha, obrigações e responsabilidades dos diretores e mais empregados, para evitar abusos quais os da anterior Junta Diretora, que tudo fizera para se perpetuar na administração.”
As emissões feitas pelo Banco foram excessivas. De 1810 a 1827, totalizaram 29.726:450$000, dos quais 27.046:450$000 foram emitidos no Rio de Janeiro, 1.490:000$000 na Bahia, 300:000$000 em São Paulo, 500:000$000 em Pernambuco e 390:000$000 em Minas Gerais. Entretanto, foram recolhidos e incinerados, de 1811 a 1823, valores no total de 10.551:530$000, de modo que, em 1829, o saldo em circulação chegava a 19.174:920$000. O fundo do Banco, em 1821, era de 2.474:556$000, formado pelo capital de 2.268 ações realizadas, equivalentes a 2.268:000$000 e fundo de reserva de 206:566$000. Não se podia dizer que estivesse em perfeito estado de solvabilidade uma instituição bancária, cuja emissão já excedia, naquele ano, mais que o triplo do seu capital.
Evidencia-se, nessa época, que o Banco estava insolvente, pois não dispunha de recursos capazes de fazer face ao troco de suas notas em circulação, mesmo que o Tesouro pagasse os 4.799:415$000 que lhe devia. Segundo Horácio Say, “os bilhetes do Banco tronaram-se excessivos para as necessidades das transações; o seu valor começou a baixar e correram ao Banco para trocá-los; mas as espécies já não estavam ali. A este primeiro sinal de depreciação, de 1818 a 1819, as moedas de prata de 960 réis desapareceram rapidamente da circulação. O real não era mais a expressão do mesmo valor, já deixavam de dar esta moeda por seu valor nominal, obteve prêmio, daí a vantagem de exportá-la. A bela moeda de ouro, de 1809, tinha sucedido a moeda fraca de prata, e esta, em 1818, achou-se substituída pelas miseráveis tiras de papel”. (Jornal do Commercio, edição de 26 de março de 1893).
Em 23 de julho de 1824, a assembléia geral do Banco resolveu fixar a tabela de realização de suas notas na proporção de 75% em bilhetes miúdos, 15% em moedas de ouro e prata e 10% em cobre, o que valia como suspensão de pagamento.
Posteriormente, a comissão liquidadora informou aos árbitros nomeados para decidir as pendências entre o Banco e o governo que, depois da data daquela tabela para o troco de suas notas, o estabelecimento continuou a fazer suprimentos ao governo e a descontar os seus papéis de crédito. Daí por diante aumentaram mais esses suprimentos, continuando-se a descontar as letras particulares até 1822, quando cessaram as transações novas. Ao chegar a essa situação, o Banco do Brasil não passava de uma caixa suplementar do Tesouro, onde o governo ia buscar dinheiro até por pedido verbal do tesoureiro geral do Erário.
Foi somente em 1827, através do “artigo 22” da “Lei de 25 de Novembro” do mesmo ano, que se proibiu o aumento da emissão, já a partir de 1º de Janeiro do ano seguinte, e ordenou-se a retirada de 6.000:000$000 de circulação, mediante a troca por apólices de 5% em paridade com as notas bancárias, o que, no entanto, não se pôde realizar, pois as apólices eram vendidas a preços diversos. A tal ponto caíra o critério do estabelecimento, que suas notas corriam por 45% de abatimento em moeda de prata, ameaçando maior baixa a cada dia. Em Abril de 1829, as notas já tinham sofrido 40% de abatimento em cobre, 110% em prata e 190% em ouro, sendo o câmbio para Londres de 23 pence por 1$000 Réis. Era impossível ir além, e assim o entendeu o Ministro da Fazenda, Miguel Calmon (posteriormente Visconde e Marquês de Abrantes), que apresentou à Câmara dos Deputados proposta do governo para dissolução do Banco através da nomeação de uma comissão liquidadora composta de sete membros, dos quais quatro escolhidos pelo próprio governo, incluindo-se o presidente, e três pela assembléia geral. A Câmara votou pela imediata liquidação do Banco, sancionada em 23 de Setembro do mesmo ano. No entanto, adiou-se a dissolução para 11 de Dezembro de 1829, data que se esgotavam os 20 anos de privilégios previstos na fundação. Para seus acionistas, o Banco não podia ser considerado uma instituição que lhe houvesse imposto qualquer prejuízo; as vantagens que auferiram foram grandes e poderiam ter sido maiores se tivessem escolhido administrações mais competentes, como demonstram os balanços dos dividendos pagos anualmente. Dissolvida a instituição, o capital foi distribuído entre os acionistas, que receberam cerca de 81% do valor primitivo das ações.
O vácuo de suporte bancário resultante da dissolução do Banco do Brasil não só provocou críticas como também motivou sugestões de criação de um novo banco de iniciativa governamental. Figuras de destaque da história brasileira, como Cândido Batista de Oliveira, senador Ferreira Soares, J.F. Normano, Pandiá Calógeras, analisaram e lastimaram a dissolução do Banco. Pandiá Calógeras, por exemplo, assinalou que na Câmara dos Deputados vários de seus membros insistiram nas vantagens de uma reorganização do Banco do Brasil, ao invés de uma liquidação pura e simples. “A antiga hostilidade contra o estabelecimento de crédito”, disse ele, levou a melhor, “escorada nas acusações de dilapidações praticadas por diretores do estabelecimento e da retirada em massa, por ocasião da volta de D. João a Portugal, em 1821, em metais preciosos que pertenciam ao Banco”.
Transformado numa espécie de bode expiatório, o Banco acabou assumindo, segundo Calógeras, a “responsabilidade pelas dificuldades de uma situação cujos erros cabiam quase que exclusivamente ao governo, por causa dos empréstimos dispensáveis que solicitou, ou melhor, impôs”. Mas, prosseguiu, “quando votada a liquidação do Banco e apresentado seu balanço, verificou-se que o papel-moeda em circulação excedia apenas de soma ínfima a dívida do Tesouro com a instituição. Os acionistas receberam 90% de seu capital integralizado, pagas todas as dívidas”.
Nenhuma crítica pode ser mais eloquente do que essas cifras, argumentou Calógeras, porque “comprovam a solvência do estabelecimento, apesar do descrédito espalhado pelos exageros e acusações malévolas contra ele arguidos. E, sobretudo, liquidado o Banco, a praça do Rio ficou longamente privada desse aparelho indispensável à sua economia comercial, erro extremamente grave que lhe foi imposto por uma decisão inconsiderada. Foi essa última consequência que motivou as críticas muito sérias e amargas a elas dirigidas desde os primeiros momentos por financistas e estadistas, e inspirou a ideia de tentar conter o desencadear das correntes que conduzissem a medidas extremas” (A Política Monetária do Brasil, páginas 45 e 46).
A primeira tentativa de restabelecimento de um banco nacional ocorreu através da Lei de 8 de Outubro de 1833, mas não teve êxito devido à falta de apresentação de acionistas. O governo chegou a nomear uma comissão para organizar o levantamento do capital, mas apenas os integrantes dessa comissão animaram-se à subscrição.
Com a insuficiência de capital, o próprio Ministro da Fazenda pronunciou-se, em Novembro de 1834, pela desistência oficial de restabelecimento do Banco, mandando reverter a receita geral dos impostos que a lei criou, com o objetivo de compor a cota de capital do governo. Até 1838, quando foi criado o Banco Comercial do Rio de Janeiro, nenhum outro banco existiu, instruído formal e regularmente, no país.
Havia, naturalmente, financiamentos que proliferavam como negócios lucrativos e sem concorrentes legalmente instituídos, realizados pelos comerciantes sob a forma de adiantamento ou vendas a crédito para seus fregueses e fornecedores ou, em maior número, os empréstimos que os comissários, sobretudo os do comércio de exportação, faziam aos fazendeiros e lavradores, sob garantia da colheita.
Esporadicamente, existiam casas bancárias em comandita, ou caixas econômicas de instauração arbitrária ou variada. Também existia a agiotagem, à qual se referiu, em relatório apresentado à Assembleia Geral Legislativa do Império, na sessão ordinária de 1837, o então ministro da Fazenda, Manoel do Nascimento Castro e Silva:
“...me parece que, no caso de se não proibir o estabelecimento de casas em que se fazem empréstimos sobre penhores, ou hipoteca, o que seria mais conforme à moral e à política, atento ao escândalo e ao abuso, com que nela se praticam as usuras e dilapidações, devem elas sofrer uma forte taxa de licença, ou patente, sendo sujeitas a um regulamento”.
Foi nessa época que começou o ocaso do período colonial – marcado inicialmente pela vinda da corte portuguesa para o Brasil – com a consequente aceleração do processo de independência política, paralelamente ao processo da independência econômica, impulsionado por medidas como a abertura dos portos. A renda per capita do país vinha caindo, continuamente, já durante o século anterior.
Na primeira metade do século XIX ainda não se via uma tendência de recuperação, mas o decesso estacionava,em face da germinação profunda dos fatores que haviam de dar partida, embora de forma incipiente, ao desenvolvimento do país.
Esse período da história brasileira, chamado regencial, que englobou o final do primeiro reinado até a consolidação do segundo, caracterizou-se, no plano político, por um processo insurrecional, ao mesmo tempo prolongado e sangrento. Logo no começo, vacilou o trono imperial do Brasil, inclusive porque, sob o impacto da impopularidade e acusado de preocupar-se mais com suas pretensões ao trono português do que com os problemas brasileiros, D. Pedro I renunciou e deixou o trono a D. Pedro II, ainda menino.
Evidentemente, esse quadro influiu negativamente na situação econômica e financeira do país. No período de 1836 a 1846, por exemplo, verificou-se que em todos os anos, salvo no último, as somas das importações foram bem mais altas do que as das exportações. O desequilíbrio econômico e, especialmente, o financeiro, que já se manifestava anteriormente, tornou-se então crônico, característica mantida até os dias atuais. Se o período regencial foi, no plano político, marcado pela turbulência das desordens e revoltas, no plano econômico caracterizou-se pela insuficiência da produção exportável e por saldos negativos na balança comercial, com constante baixa dos valores externos e internos da moeda. Manteve-se, ademais, o processo inflacionário.
O CAOS FINANCEIRO
No início, quando do surgimento das instituições bancárias, entregar o dinheiro suado, fruto de duro trabalho, para ser guardado por pessoas desconhecidas, não deve ter sido uma decisão fácil. Apesar da desconfiança da população, as instituições financeiras prosperaram e hoje, certamente, detêm uma parcela considerável no poder, em todo o mundo. É evidente que desvios e apropriações indevidas do dinheiro dos correntistas e investidores vivem acontecendo, fato comprovado pelas manchetes em todo o mundo. No Brasil não poderia ser diferente; com um sistema bancário tão frágil, com uma justiça lenta com leis que mais se prestam aos banqueiros do que aos cidadãos comuns, nosso país conta com um dos maiores índices de corrupção e desvio de dinheiro público.
A história das fraudes financeiras no Brasil é anterior à nossa Independência; teve início em 1808, ano em que, devido à chegada da família real, deixamos de ser apenas um território além-mar da Metrópole portuguesa e passamos a ser o centro de um reino com possessões espalhadas por todos os continentes. Até aquele momento, o Brasil era uma colônia, terra de conquista e exploração, um sistema no qual todo e qualquer desenvolvimento econômico visava somente a servir aos senhores da situação, nesse caso, a nobreza portuguesa. Naquela época, o Brasil era basicamente o lugar onde eram extraídas e produzidas as commodities (ouro, diamantes e os produtos derivados das plantações no Nordeste).
Essa exploração mudou quando as guerras napoleônicas mexeram com o cenário do continente europeu. Sob a ameaça de uma invasão das tropas francesas, a família real decidiu abandonar, em Novembro de 1807, Lisboa, instalando-se no Rio de Janeiro que, devido à presença dos reais, tornou-se a capital do Reino, colocando o Brasil em posição privilegiada e, em certos aspectos, em pé de igualdade com Portugal.
A família real desembarcou no Brasil em Janeiro de 1808, na Bahia, partindo para o Rio de Janeiro em 26 de Fevereiro do mesmo ano. Junto com os reais, chegaram 276 fidalgos que recebiam uma verba anual em moedas de ouro. Além dos primeiros a desembarcar na cidade, com o tempo outros foram chegando, aumentando a necessidade de dinheiro para sustentar todos os vícios, luxo e comodidades a que estavam habituados. Assim, o país contraiu o seu primeiro empréstimo com os ingleses, num total de 600.000 libras esterlinas.
Precisando garantir todo luxo a que estava habituada a corte e criar condições favoráveis à sua permanência – haja vista a precária situação do Rio de Janeiro, se comparado à Metrópole – o Príncipe Regente D. João, decidiu criar o primeiro Banco do Brasil, sob o patrocínio e execução do Estado Nacional. Antes dessa iniciativa, houve uma tentativa falida de se criar uma instituição bancária no Maranhão, quando o governador da Província quis criar um banco de crédito para financiar a agricultura local.
Portugal não era um país que se podia denominar como sendo uma nação com tradição bancária. Iniciou seu próprio sistema no setor, somente a partir do século XVIII, praticamente duzentos anos depois do restante da Europa. Além disso, a idéias de se criar um banco para financiar os gastos da corte, era – para não dizer absurda – problemática. Em todo continente europeu, as instituições bancárias surgiam com as mudanças estruturais da sociedade e das economias nacionais que se manifestavam através do comércio, da agricultura e da necessidade de se prover o crédito às atividades intimamente ligadas ao desenvolvimento, tais como as ferrovias. Foi assim na Inglaterra, onde os bancos promoveram a Revolução Industrial, na França e em todo o restante dos países europeus que compreendiam a necessidade dos bancos e que estes não eram simples instrumentos de financiamento de gastos e luxo e sim uma ferramenta importante para o desenvolvimento econômico.
Talvez devido à sua própria concepção, o Primeiro Banco do Brasil já tenha nascido fraudulento e, consequentemente, destinado ao fracasso. Com a intenção primária de financiar os gastos da corte, o capital (1.200 contos de réis) destinado à criação da instituição teve origem tanto na venda de ações aos brasileiros ricos, em troca de títulos concedidos à recém-criada nobreza brasileira, quanto na emissão de dinheiro sem lastro.
Figura: Instalado em prédio da antiga Rua Direita, no Rio de Janeiro, o BB tornou-se o quarto banco emissor no mundo, depois do Banco da Suécia (1668), da Inglaterra (1694) e da França (1800). |
Dessa forma, nascia o Primeiro Banco do Brasil, um misto de banco comercial para financiar e impulsionar a economia e uma espécie primordial de Banco Central Brasileiro, mais de 150 anos antes da criação do atual BC. Além de ser o quarto banco emissor do mundo, estando atrás apenas da Suécia, Inglaterra e França, também atuava em depósitos e descontos, detendo também o monopólio de venda de produtos para a coroa portuguesa. Em outras palavras, enquanto a produção do dinheiro sem lastro ficava com o banco, o monopólio dos produtos pertencia à coroa.
A missão de financiar a nobreza e a emissão de dinheiro sem lastro fizeram do Banco do Brasil um terreno fértil para o caos e a fraude. A emissão de dinheiro sem lastro tem sido uma “solução” recorrente para financiar gastos exorbitantes e cobrir o déficit oriundo da má gestão do dinheiro. Governantes optam por emitir dinheiro indiscriminadamente e usá-lo para pagar as contas públicas. Esse enorme quantidade de dinheiro sem valor, cai na economia, inflacionando os preços e, consequentemente, prejudicando a população que acaba pagando um preço elevado pela incompetência e descaso do governo.
O Banco do Brasil resistiu bravamente aos seus primeiros anos, mas bastaria um tremor na economia para desestabilizar a situação, a ponto de quebrá-lo, dessa forma expondo também as inúmeras fraudes cometidas.
Essa instabilidade não demorou muito para acontecer. Vinha se desenhando antes mesmo da chegada da família real ao Rio de Janeiro. Além da Carta Régia que deu origem ao Banco do Brasil, D. João tomou outras providências, ainda em Salvador, local do primeiro desembarque da família real; decretou a abertura dos portos brasileiros ao comércio mundial, acabando com o monopólio de Portugal e também revogou um decreto criado por sua mãe, a rainha D. Maria I, que proibia ao Brasil produzir bens industriais.
Apesar de louváveis, estas duas medidas alteraram profundamente as relações econômicas entre o Brasil e Portugal que despencou. As exportações do Brasil para a metrópole caíram pela metade e o saldo comercial que antes era positivo e havia chegado a mais de 28.000 contos de Réis entre 1796 e 1807, caiu para 1.732 contos e em pouco tempo praticamente deixou de existir.
As exportações do Brasil para Portugal, caíram para menos da metade após a chegada da família real. Isso teve como consequência imediata, repercussões na economia portuguesa, principalmente na situação cambial do país, acelerando a saída de produtos preciosos como o ouro e diamantes, necessários para que Portugal cobrisse seus débitos comerciais. A crise econômica que vinha se desenhando teria impacto sobre o recém-criado Banco do Brasil, afetando todo o país que a essa altura gastava muito mais do que recebia. Nos anos seguintes, a situação só viria a se agravar ainda mais.
Foi nesse cenário econômico catastrófico que o Brasil proclamou sua Independência de Portugal em 1822, com a coroa lusitana retornando a Portugal, deixando o país em situação financeira calamitosa.
Primeiro, o Brasil se viu obrigado a assumir uam dívida de 1,4 milhões de libras esterlinas que Portugal havia contraído com Londres, assim como pagar mais 600.000 libras a Portugal pelas “posses que haviam deixado”. Esse montante de 2 milhões de libras esterlinas foi o preço da nossa “Independência”.
Por outro lado, para piorar ainda mais a já péssima situação das finanças públicas, o Brasil passou a contrair uma série de empréstimos para conseguir fechar as contas. Em 1824 – apenas dois anos após a Independência – o país contraiu o seu segundo empréstimo, primeiro do Brasil independente, no valor de três milhões de Libras. Em 1825, apenas um ano após contrair o primeiro empréstimo, o Brasil fez mais uma dívida de 3,7 milhões de libras esterlinas e ao final do primeiro Império, em 1829, contariu com a Inglaterra, outro empréstimo de 4 milhões de libras.
Nesse meio tempo o Banco do Brasil – que a essa altura já se encontrava em regime falimentar – tinha sido usado como instrumento para conter a grave crise que se instalara no país. Por conta das emissões sem nenhum tipo de controle e de lastro, as notas emitidas pelo Banco perdiam muito do seu valor frente à moeda metálica, cujo valor era medido pelo conteúdo de metal precioso nela contido. É nesse momento que surgem os primeiros casos de fraude bancária no Brasil, bem no meio de uma grave crise econômica e pouco depois da proclamação da Independência. Quatro (4) diretores do Banco causaram a falência da instituição; um deles, o tesoureiro, resolveu fugir para os Estados Unidos – por incrível que pareça deixando toda família no Brasil – carregando consigo todos os fundos de uma companhia de seguros, e que haviam sido confiados à tesouraria do Banco.
A corrupção, já naquela época, era sistêmica. Diretores e acionistas do Banco conseguiam contrair empréstimos com juros de 6% ao ano e os repassavam, como autênticos agiotas, a 24% a.a., a quem desse garantias. Além disso, ainda determinaram que o Banco – falido, diga-se de passagem – pagaria elevados dividendos de 18% anuais para os seus acionistas. Não demorou muito para que D. Pedro I resolvesse dar um basta na situação, criando, em 1829, a Lei que extinguiu o primeiro Banco do Brasil, muito embora o seu fechamento ainda tenha levado alguns anos para se efetivar.
D. Pedro justificou o fechamento do Banco, afirmando que o fazia por excesso de emissões de notas a fim de atender às necessidades do Erário e também devido ao exagerado número de irregularidades e fraudes cometidas pela diretoria da instituição. O imperador necessitava, com urgência, de uma ampla reforma econômica, haja vista a grave crise que se instalara em todo o território.
Além disso, foram contraídos outros vultosos empréstimos, a juros de 5% ao ano, para financiar as campanhas na Guerra Cisplatina que resultou na separação do Brasil e Uruguai. Não só isso, era necessário conter as diversas rebeliões regionais que surgiam em todo o território. Com tudo isso, a recêm-criada moeda de papel perdia valor frente às estrangeiras, com uma desvalorização que chegou a 100%.
Assim, o nosso primeiro Banco estatal terminaria por brindar o país com escandalosos casos de fraudes financeiras e má gestão dos recursos da instituição, uma história que se repetiria por outras dezenas de vezes, até os dias de hoje.
OS PRIMEIROS BANCOS PRIVADOS
Com o fim do primeiro Banco do Brasil, os agiotas passaram aos credores, oferecendo empréstimos a mais de 2% ao mês, a quem lhes desse as devidas garantias. Essa situação perdurou por anos, até o momento em que os comerciantes do Rio de Janeiro fundassem, em 1838, nove anos após o fechamento do banco estatal, o primeiro banco de crédito privado, o Banco Comercial do Estado do Rio de Janeiro. No Ceará já havia sido fundado o Banco do Ceará que não tinha o mesmo movimento e nem despertara o interesse como o que aconteceu com o banco carioca.
O Banco Comercial do Rio de Janeiro teve um bom desempenho por muitos anos e não se afundou em fraudes como fez seu predecessor estatal. Muito pelo contrário, deixou de existir apenas em 1853, sem problemas administrativos, quando se fundiu com o segundo Banco do Brasil.
Outros diversos bancos surgiram, tais como o Banco Comercial da Bahia, o Banco Comercial do Maranhão, o Banco do Pará e o Banco Comercial de Pernambuco.
PRIMEIRA PLURALIDADE BANCÁRIA EMISSORA
Como vimos, quase uma década após a extinção do Banco do Brasil, em conseqüência do aparecimento do Banco Comercial do Rio de Janeiro, o Tesouro Nacional perderia o monopólio do poder emissor no Rio de Janeiro e em outras partes do país. Após uma tentativa malfadada – devido à falta de concorrência à subscrição pública de parte do capital estipulado para o novo estabelecimento emissor – de organização de um banco nacional em 1833, através da Lei nr. 59 de 8 de Outubro do mesmo ano, o país viveu algum tempo sem bancos. Somente na segunda metade da década de 1830 surgiram, timidamente, novos bancos comerciais no país. Na década subsequente se daria a abertura de diversos bancos nas principais praças comerciais do Império, e obviamente, também na Corte.
Estes bancos eram, em geral, organizados por comerciantes que empregavam grandes fundos em tráficos, manufaturas e fábricas alavancando e movimentando a indústria nacional, gerando uma grande quantidade de empregos. Alavancavam e impulsionavam o comércio e a nascente indústria, com sagacidade, inteligência e rapidez. Assim o espírito dos grandes negociantes, sempre afiado e exercido em imensa variedade de combinações, surgiu para atender, sobretudo, a demanda do comércio pela moeda e pelo crédito necessários para a realização de suas transações. Para cumprir com suas tarefas, emitiram vales próprios que entravam em circulação. São os bancos a seguir:
Banco Commercial da Bahia.
Banco Commercial do Maranhão.
Banco Commercial do Pará.
Banco Commercial do Rio de Janeiro.
Banco do Brazil de Mauá (Instituição Privada - 2o Banco do Brazil).
Banco de Pernambuco.
Com o encerramento das atividades do primeiro Banco do Brasil, a oferta de crédito passou a ser uma atividade quase exclusiva da iniciativa privada. Os financistas mais importantes eram os comerciantes, comissários residentes no Brasil ou em Portugal, que financiavam os agentes econômicos ligados à grande lavoura exportadora. Além destes, existiam as casas comerciais e as casas de descontos (mais conhecidas como casas bancárias) que funcionavam como autênticos bancos.
Enquanto as casas comerciais atendiam aos interesses do grande comércio atacadista e varejista financiando a compra de mercadorias importadas pelos comerciantes locais, através da assinatura prévia de títulos de dívida privada (ativos negociáveis), as casas de descontos, algumas delas organizadas por corretores, comercializavam divisas e atuavam no mercado secundário, através do desconto antecipado de letras de crédito privadas. Essas operações de crédito eram realizadas sem o controle do Estado, pois ainda não havia sido promulgado o Código Comercial.
A primeira Caixa Econômica antecedeu a criação do Banco Comercial do Rio de Janeiro. Surgiu na Corte em 1831 e foi organizada com capitais de origem privada, graças a iniciativa de José Florindo de Figueiredo Rocha. O alvo da instituição eram as pequenas poupanças de trabalhadores e de escravos que depositavam as suas economias nas cadernetas da instituição*.
Nota: *A Caixa Econômica do Rio de Janeiro sobreviveu durante vinte e oito anos e não foi a única da Província. Em 1834, surgiu a de Campos.
O BANCO COMERCIAL DO RIO DE JANEIRO
O aparecimento da moeda e dos bancos no Rio de Janeiro foi conseqüência da posição geográfica e da importância econômica e política da região. O Rio de Janeiro é uma cidade litorânea onde o porto foi estratégico na formação de um mercado interno, indispensável para a monetização da economia e para o surgimento de bancos. Do grande comércio exportador emergiram as elites responsáveis pelo crédito que passou das mãos de prestamistas individuais para o controle de bancos comerciais.
A vinda do Estado Português para o Brasil, em 1808, foi decisiva para consolidar a importância política, econômica e cultural da região. A necessidade de financiar os gastos governamentais deu origem ao Banco do Brasil que concentrou as suas atividades no Rio de Janeiro e contribuiu, via a emissão de notas bancárias, para desenvolver o mercado local.
A expansão da cultura do café possibilitou a formação do Banco do Commercio do Rio de Janeiro, o primeiro banco privado dessa localidade. Contudo, a organização de estabelecimentos bancários no Rio de Janeiro só cresceria após o fim do tráfico negreiro, o qual liberou capitais que foram redirecionados para às atividades bancárias. Nesse contexto, também foi importante a promulgação do código comercial que serviu para regulamentar o funcionamento das sociedades anônimas e a profissão de banqueiro.
A história dos bancos no Rio de Janeiro durante o Império reflete as oscilações do desejo do governo Imperial de deter o monopólio das emissões e manter o padrão-ouro e dos bancos particulares que, via de regra, preferiam a pluralidade emissora e menos rigidez em relação ao lastro metálico.
Em um modelo primário exportador, os bancos da Corte e da Capital da República concentraram as suas operações no financiamento do comércio e das atividades urbanas. Nesse contexto, a agricultura era financiada ou com os recursos do Banco do Brasil ou com os lucros obtidos na produção.
Durante o Império, os bancos estrangeiros foram os principais agentes de crédito do país. Atuaram no grande comércio exportador e financiaram investimentos em infra-estrutura econômica, através de companhias de seus países de origem. Tal importância só se reduziria na República quando a política nacionalista de Vargas garantiria aos banqueiros nacionais a liderança do sistema bancário do país.
O Banco Commercial do Rio de Janeiro foi o primeiro banco emissor privado do Rio de Janeiro (o primeiro banco comercial emissor foi o Banco do Ceará fundado em 1836). Dirigido por François Ignace Ratton abriu as suas portas na rua da Alfândega, em 1838, mas só teve a sua Carta Patente aprovada em 23 de junho de 1842. Os capitais para a formação do Banco vieram de negociantes ligados ao comércio de importação e exportação de café, produto que vinha sendo cultivado no Vale do Paraíba fluminense, desde 1830.
O capital inicial do Banco foi fixado em 5.000 mil contos de réis, divididos em 10 mil ações de $500 réis cada uma. Autorizado a funcionar por um período de 20 anos, o Banco Comercial do Rio de Janeiro, de acordo com os seus estatutos, tinha permissão para efetuar as seguintes operações:
● Depósitos em moedas, jóias, ouro, prata e papéis (títulos de dívida do governo e papéis privados);
● Abertura de contas correntes;
● Desconto de letras de câmbio e da terra, de títulos públicos e de particulares;
● Empréstimos com base em moeda forte, títulos governamentais e ações do próprio Banco e de quaisquer companhias, ficando seus donos responsáveis pelo pagamento da quantia emprestada.
O parágrafo 12 dos estatutos autorizava o Banco a”comprar e vender metais preciosos caso viesse a ser de emissão ou se quisesse tornar as suas notas realizáveis em metais” Mas, ao legislar sobre a emissão dos vales bancários, o governo imperial estabeleceu que o Banco não poderia emitir vales com prazos de resgate superiores a 10 dias, com valores inferiores a 500 réis e em proporção maior a um terço do capital.
Tais restrições à livre circulação e emissão de vales bancários do Banco Comercial mostravam a disposição do Império brasileiro de centralizar o poder emissor. Na prática, como raramente os vales eram trocados por moeda, acabaram desempenhando a função de papel-moeda e serviram como meio de pagamento no comércio fluminense.
A lucratividade do Banco era decorrente da diferença entre os percentuais dos juros pagos aos depositantes (4 a 4,5%) e as taxas cobradas em redesconto de letras, 6 a 7% ao ano. Ainda dependente das relações pessoais dos comissários, o Banco Comercial do Rio de Janeiro concedia “empréstimos através de um intermediário, um comissário ou um outro comerciante ligado ao setor importador e exportador, pois além de conhecerem os tomadores de empréstimos, os comerciantes tinham interesse direto neste tipo de operação uma vez que alguns deles eram acionistas do Banco e recebiam dividendos”.
Como os prazos fixados pelo Banco para a concessão de seus empréstimos eram em média de 4 meses, os setores ligados à agricultura e à indústria não puderam ser beneficiados com os financiamentos oferecidos pelo Banco, que acabaram sendo direcionados para as atividades comerciais.
A austeridade da política emissionista do Banco Comercial do Rio de Janeiro limitava a sua capacidade de atender a demanda de crédito no Rio de Janeiro. Comparando a praça do Rio de Janeiro à de Nova York, nos EUA, Bernardo de Souza Franco chamou atenção para o fato de que “com uma população de quase 200 mil habitantes o Rio de Janeiro tinha, em 1848, apenas um estabelecimento bancário com um capital de 2.500 contos de réis, enquanto a cidade de Nova Iorque, nessa mesma época possuía cerca de 312.710 habitantes que dispunham de 24 bancos, com o capital de mais de 50 mil contos de réis multiplicado por inúmeras emissões de notas”. O autor acrescenta, ainda, que “em 1844 o estado de Nova Iorque possuía 150 estabelecimentos bancários” e considerava a existência destes estabelecimentos um fator importante para assegurar o dinamismo do comércio e de outras atividades econômicas.
A importância atribuída por Souza Franco às emissões de papel-moeda, mesmo sem lastro integral, para promover o crescimento econômico era um dos principais princípios da chamada escola papelista. Defendendo a pluralidade emissora, os papelistas opunham- se aos adeptos da escola metalista que acreditavam que a estabilidade monetária poderia ser alcançada através de emissões de papel- moeda lastreadas em metais preciosos (moedas conversíveis) e do poder emissor centralizado em um só banco, como passou a ser feito na Inglaterra após a assinatura do Peel Act (1844) que limitou os direitos de emissão dos bancos particulares.
Em linhas gerais, os metalistas e os papelistas reproduziram no Brasil o debate teórico travado no século XIX na Inglaterra entre os defensores da Currency School, da Banking Schoool e da Free Banking School. A Currency School defendia que os resultados da balança comercial de um país regulavam a quantidade de moeda em circulação, os preços internos e os níveis das taxas de câmbio. Assim, o receituário dos adeptos dessa escola para manter a estabilidade monetária era a defesa do padrão-ouro, da conversibilidade do papel-moeda e o monopólio emissor.
A Banking School opunha-se a Currency School, pois defendia a pluralidade emissora e o lastro das notas não só em moedas metálicas, mas também em papéis. Os adeptos dessa corrente negavam que “as variações nas emissões de papel-moeda pudessem causar alterações no nível de preços domésticos, ou mesmo pudessem levar a uma queda do nível das reservas” (Eatwell, Milgate, Newman). Acreditando que se houvesse um sistema bancário competitivo não haveria excesso de emissão ou de inflação, pregavam a pluralidade emissora, sem serem radicais, pois reconheciam a necessidade de um banco central para manter a estabilidade econômica. Por último, a Free Banking School, como o nome já diz, era contrária aos fundamentos das duas outras escolas e defendia a ausência de normas de regulamentação do meio circulante e a inexistência de um banco central.
Inspirados nestes princípios, os metalistas brasileiros faziam a defesa da estabilidade monetária através da adoção do padrão- ouro e do monopólio da emissão em poder de um banco público. Em contraposição, os papelistas consideravam que o metal, apesar de sua ótima aceitação, não poderia ser um instrumento de permuta exclusivo de uma sociedade desenvolvida, com uma estrutura financeira avançada, pois apresentava alguns inconvenientes – escassez, dificuldade de transporte e de contagem – que impediam um desenvolvimento maior do sistema bancário e consequentemente levavam à escassez da moeda. Daí a proposta da pluralidade emissora para assegurar a liquidez monetária, mesmo quando houvesse um banco público.
A Lei 401, de 11 de Setembro de 1846, regulamentada pelo Decreto 487 de 28 de novembro do mesmo ano, inseriu o país nas regras do padrão-ouro ao estabelecer a paridade fixa de 27 pences para cada mil réis colocando, pelo menos em tese, um limite à expansão do papel-moeda e dando uma vitória momentânea aos metalistas.
Em 1850, Eusébio de Queirós, Ministro do Império brasileiro, seguindo os preceitos do Bill Aberdeen, resolveu aprovar, em Setembro daquele ano, a Lei 531 extinguindo o tráfico de escravos no Brasil. A partir de então, os capitais que vinham sendo aplicados na compra e venda de escravos africanos migraram para novas atividades econômicas, possibilitando o surgimento de novos bancos e empresas.
A liberação destes capitais foi seguida da promulgação do Código Comercial (Lei n° 556 de 25 de junho de 1850) e da Lei de Terras (Lei n° 601, de 18 de setembro de 1850), peças jurídicas essenciais para o funcionamento destes estabelecimentos. O primeiro reconheceu legalmente a profissão de banqueiro e regulamentou juridicamente a organização dos bancos e dos contratos de financiamento (inclusive daqueles garantidos por hipotecas), a segunda tornou a terra um ativo negociável.
Graças ao Código Comercial - que deu garantias legais à organização de empresas no Brasil - e a disponibilidade de capitais - foi possível a abertura no Rio de Janeiro de novas sociedades anônimas, principalmente, no setor de serviços e de infra-estrutura econômica (no Rio de Janeiro foram poucas as indústrias que assumiram a forma de sociedades anônimas). A negociação das ações destas empresas, especialmente de bancos e de companhias de seguros, deram início as atividades da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Esta última existia desde 1848, mas os corretores concentravam as suas atividades na negociação de títulos da dívida pública e não de ações de empresas privadas.
Em meio a esta moldura institucional favorável, Irineu Evangelista de Souza, mais conhecido como Barão de Mauá, um dos maiores negociantes do Rio de Janeiro, proprietário do Estaleiro Ponta de Areia e sócio da firma inglesa Carruthers e Companhia, associou-se a outros importantes comerciantes e corretores e fundou, em 1851, o Banco do Commércio e da Indústria do Brasil, mais conhecido como Banco do Brasil de Mauá. O capital da sociedade, de 10.000 contos de réis, era considerado grande (correspondia a um terço do valor do Orçamento do Império para o ano de 1851) para os padrões da época e foi dividido em 20 mil ações, de $500 réis cada uma.
O Banco do Commércio e da Indústria do Brasil transformou a natureza do financiamento no Rio de Janeiro. A oferta de crédito, até então, dominada por prestamistas individuais – comissários – passou a ter o formato de uma moderna intermediação financeira, onde os recursos de terceiros eram emprestados por intermédio de uma instituição bancária e não através de relações pessoais.
O Banco do Comércio e da Indústria do Brasil conseguiu abrir filiais fora do Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul e em São Paulo. A abertura destas filiais visava facilitar o comércio da carne verde, entre a Corte e as províncias do Sul, já que os principais acionistas do banco, entre eles Mauá, negociavam com esse produto. Graças a iniciativa de Mauá a Província do Rio Grande do Sul passou a ter, a partir de 1852, o seu primeiro estabelecimento bancário.
O Banco Comercial do Rio de Janeiro e o banco de Mauá reforçaram no Rio de Janeiro a emissão de notas bancárias de origem privada, mas o peso relativo do papel moeda emitido pelos bancos era, sem dúvida, pouco expressivo. Em 1852, o total de papel- moeda em circulação no Brasil era de 50.315 contos de réis. Destes apenas 3.631 contos de réis, ou seja 7,3%, correspondiam ao papel-moeda de origem bancária. Em outras palavras, o papel moeda em circulação, naquele ano, era composto, basicamente, de notas emitidas pelo Tesouro nacional que somavam 46.684$ contos de réis, ou seja 92,7% do total do papel-moeda circulante.
Fora do mundo das finanças, Mauá criou empresas responsáveis pela modernização da cidade que permitiram à Corte participar dos benefícios oriundos da segunda revolução industrial. Fazem parte deste elenco a Companhia de Iluminação a Gás do Rio de Janeiro, a Estrada de Ferro de Petrópolis e a Imperial Companhia de Navegação a Vapor. Além destas, vale à pena mencionar a Companhia de Bondes Jardim Botânico que inaugurou o bonde movido à tração animal, sobre trilhos, e contribuiu para o crescimento dos transportes públicos no Rio de Janeiro*.
Nota: *Esta empresa logo atraiu os capitais norte - americanos tornando-se a Botanical Rail Road Company.
Em 1853 D. Pedro II assinou a lei 683, em 5 de julho de 1853, e criou um novo Banco do Brasil. A partir daí, o meio circulante da Corte voltaria a sofrer novas alterações decorrentes da substituição das notas do Tesouro pelas notas do Banco do Brasil e do aumento do papel-moeda de origem bancária. Para garantir o monopólio das emissões e ao mesmo tempo reunir os capitais necessários à abertura do Banco do Brasil, o governo imperial forçou a fusão do Banco do Commércio e da Indústria do Brasil e do Banco Comercial do Rio de Janeiro com o Banco do Brasil, obrigando os proprietários dos estabelecimentos bancários privados a cederem seus direitos de emissão e a subscreverem as ações do banco estatal recém-formado. Após a subscrição, o Banco do Brasil foi aberto com o capital inicial de 30.000 contos de réis e os antigos diretores do Banco Comercial do Rio de Janeiro e do banco de Irineu Evangelista de Souza passaram a fazer parte da sua primeira diretoria. A este segundo banco público, com sede no Rio de Janeiro, foram atribuídas não só as funções características de um bancos comercial – abertura de contas correntes, recebimento de depósitos e concessão de empréstimos – mas outras operações típicas dos modernos bancos centrais tais como o redesconto e a emissão de notas, instrumentos importantes no controle da liquidez monetária.
Apesar da centralização do poder emissor em mãos do Banco do Brasil limitar a liquidez monetária e consequentemente a expansão do crédito, investir na organização de bancos na Corte era um bom negócio, pois havia nos primeiros anos de 1850 um clima de prosperidade econômica e de estabilidade política.
Nos anos de 1853 a 1856, fase em que o Banco do Brasil deteve a exclusividade do poder, surgiram dois estabelecimentos bancários no Rio de Janeiro: o Banco Rural e Hipotecário e a Casa Mauá Mac-Gregor, esta última a maior casa bancária privada de toda a época do Império.
O Banco Rural e Hipotecário era uma sociedade anônima que foi organizada com o capital inicial de 8.000$ contos de réis. Dirigido por uma diretoria formada de um fazendeiro e três importantes negociantes fluminenses* foi o primeiro estabelecimento bancário do Rio de Janeiro a emprestar dinheiro aceitando como garantias hipotecas de bens de raiz e de propriedades urbanas e rurais.
Nota: *A diretoria do Banco era composta de Belarmino Siqueira (fazendeiro e Deputado pela Província do Rio de Janeiro) e três negociantes: João Pedro Saião, João Batista Fonseca e Antonio Ribeiro Forbes.
A Casa Mauá Mac-Gregor e Companhia foi organizada em Julho de 1854, mas só abriu as portas em 1855, como uma sociedade em comandita por ações*. Um dos sócios gerentes escolhidos para compor a diretoria era João Inácio Tavares, ex-diretor do Banco do Commércio e da Indústria do Brasil e o outro Alexander Donald MacGregor, um negociante nascido em Liverpool, indicado para representar a empresa. em Londres. Irineu Evangelista de Souza e José Henrique Reynell de Castro, de origem portuguesa e sócio da Carruthers, Castro & Co completavam a gerência da empresa.
Nota: *Para poder existir legalmente esta forma de organização empresarial dependia apenas de um registro na Junta Comercial, estando fora do controle rígido imposto pelo governo às sociedades anônimas, regidas pelo Código Comercial..
Mauá gozava de enorme prestígio entre os comerciantes do Rio de Janeiro, liderança conquistada na presidência da Sociedade dos Assinantes da Praça do Rio de Janeiro (atual Associação Comercial do Rio de Janeiro) e através da sua atuação na Comissão encarregada de redigir o Código Comercial. Assim, não foi difícil para o empresário reunir 182 (cento e oitenta e dois) sócios comanditários para organizar a Mauá Mac-Gregor e Companhia. Apesar dos muitos comerciantes brasileiros, o empreendimento tornou-se atrativo para investidores estrangeiros, principalmente ingleses, portugueses e franceses que atuavam no grande comércio de importação e exportação.
Na história das instituições de crédito do Rio de Janeiro e do Brasil, o aparecimento da Casa Mauá Mac-Gregor e Companhia corresponde a um verdadeiro ponto de inflexão. Isto porque, a exceção do Banco do Commércio e da Indústria do Brasil e do Banco do Brasil que tiveram filiais em localidades fora do Rio de Janeiro, o que se conhecia naquela época eram bancos estritamente locais. Somente a Casa Mauá Mac-Gregor e Companhia conseguiu abrir agências na Europa e nos Estados Unidos, os maiores centros financeiros mundiais do século XIX. A presença de Mauá nas praças de Londres, Manchester, Nova Iorque, Montevidéu, Rosário, Córdoba e no Rio de Janeiro possibilitava ao empresário lucrar com os negócios de câmbio, ou seja com a compra e a venda de divisas estrangeiras e troca de letras de câmbio. Ter filiais no exterior constituía, sem dúvida, uma vantagem estratégica em relação às demais instituições de crédito que funcionavam no Rio de Janeiro naquela época.
Figura: Cédula de 20 pesos do Banco Mauá & Cia de Montevideo, divisão do Segundo Banco do Brasil. |
Além da Casa Mauá Mac-Gregor e Companhia, do Banco do Brasil e de bancos comerciais privados, operavam no Rio de Janeiro, desde a primeira metade do século XIX pequenas casas bancárias que apesar de realizarem operações idênticas às dos bancos comerciais diferiam destes em relação à natureza jurídica e ao volume de capital necessário para o seu funcionamento. Enquanto as casas bancárias eram companhias de capitais fechados, a maioria dos estabelecimentos bancários já nasceu sob a forma de sociedades anônimas. Possivelmente esta foi a razão das casas bancárias serem abertas com capitais girando em torno de 300 a 1.500 contos de réis, quantias bem inferiores aos capitais que deram origem aos bancos fluminenses. Na década de 1850, durante a fase de prosperidade dos negócios com o café, floresceram algumas casas bancárias no Rio de Janeiro.
A mais importante era a Souto & Cia fundada pelo português Antônio José Alves Souto que há anos trabalhava na Corte como corretor de títulos e de outros valores; tinha título de nobreza e gozava de muito prestígio junto à colônia portuguesa fluminense chegando a ocupar o cargo de presidente da Beneficência Portuguesa. Além desta estabeleceram-se no Rio de Janeiro outras casas bancárias dentre as quais incluem-se a Gomes & Filhos e Companhia, especializada na captação de pequenas poupanças de trabalhadores livres e escravos; a Montenegro, Lima & Companhia, a Oliveira Bello e a Amaral Pinto.
O cliente preferencial das casas bancárias era aquele cuja demanda de crédito não podia ser satisfeita através de empréstimos diretos do Banco do Brasil, ou dos bancos comerciais privados. A oferta de crédito destas casas bancárias não era composta apenas de depósitos feitos pelo público mas, também, de empréstimos obtidos em bancos particulares e no Banco do Brasil. Parte dos lucros destes estabelecimentos advinha de operações triangulares, ou seja, das diferenças entre os valores das taxas de desconto pagas pelas casas bancárias aos bancos comerciais e dos altos juros cobrados dos tomadores de empréstimos.
Em 1857 a economia cafeeira entrou em crise, com quedas acentuadas nas exportações e nas cotações dos preços do café no mercado mundial. Em meio à retração econômica, o governo Imperial afastou o ministro papelista Souza Franco da pasta da fazenda e colocou em prática os princípios metalistas através da promulgação da Lei 1083, de 22 de agosto de 1860.
A nova legislação limitava a liquidez monetária determinando que nenhum banco privado poderia emitir vales, enquanto não se mostrasse capaz de reembolsá-los em ouro. Apenas o Banco do Brasil e suas filiais tiveram essa autorização, o que demonstra que incapaz de eliminar a pluralidade o Governo procurou cerceá-la. A “Lei dos Entraves” abalou o sistema bancário carioca. Os bancos Comercial e Agrícola e o Rural e Hipotecário perderam seus direitos de emissão e o Banco Comercial e Agrícola, fundado durante a administração de Souza Franco, foi liquidado. Houve uma forte retração da liquidez, seguida da alta das taxas de juros e da falência de casas bancárias. O Banco do Brasil tentou intervir na crise e concedeu empréstimos à Casa Souto que acumulou uma dívida de 22 mil contos de réis, o que correspondia à metade do capital do Banco do Brasil. A impossibilidade do Banco do Brasil de continuar a rolagem das dívidas da Casa Souto, levou-a à falência e espalhou um verdadeiro pânico nos comerciantes da Corte conforme evidencia a carta de José Joaquim de Lima e Silva, Conde de Tocantins e Presidente da Associação dos Comerciantes do Rio de janeiro, ao Imperador D.Pedro II.
“Senhor - a Comissão da Praça do Comércio vem respeitosamente trazer ao conhecimento do governo de Vossa Majestade o estado calamitoso em que se acha esta praça, em conseqüência da catástrofe comercial ocorrida no dia 10 do corrente, pela suspensão que fez dos seus pagamentos a casa bancária Antonio J.A do Souto & Cia. O pânico que sobre o público produziu este acontecimento não se pode descrever mas pode ser avaliado por todos quantos conhecem a importância desta casa, a grande quantidade de depósitos que tem em si e o entrelaçamento em que se acha com todos os Bancos e principais casas de comércio desta praça....O susto e a desconfiança tornaram-se gerais e o resultado foi correrem os portadores de títulos, não só desta casa como de outras, a exigirem das mesmas o embolso imediato deles.
Teve ela como imediato resultado paralisar o crédito, suscitar uma desconfiança geral, e fazer pairar sobre todas as casas comerciais, que em grande número se acham ligadas com a mencionada casa bancária, uma ameaça de se verem arrastadas na mesma catástrofe. Quem pode prever até onde chegarão as conseqüências deste acontecimento?
Por outro lado, o Banco do Brasil, principal credor da mencionada casa, não só se acha ameaçado de graves prejuízos, como já se vê atacado por uma corrida sobre seu fundo disponível, corrida que principiou hoje, e que não é possível prever quando acabará. A Comissão desta praça, confiada no zelo de que Vossa Majestade Imperial sempre se mostra possuído pelo bem do país e no interesse que lhe merece tudo quanto diz respeito à prosperidade e a grandeza do Império, aguarda tranqüila as medidas que aprouver ao Governo Imperial tomar para salvar essa praça da formidável crise por que está passando”.
Após a crise de 1864, saíram fortalecidos os bancos estrangeiros e o Banco do Brasil. Os bancos privados nacionais fluminenses quase não resistiram à crise bancária. Mauá liquidou, em 1866, a Casa Mauá MacGregor e Cia e abriu um novo banco, chamado Banco Mauá & Cia que entraria em processo de liquidação em 1875.
Os bancos estrangeiros vinham tendo um papel relevante na estrutura de crédito do Rio de Janeiro desde que empresários e comerciantes ingleses estabelecidos na Corte resolveram criar o London and Brazilian Bank e o Brazilian and Portuguese Bank, mais tarde denominado de English Bank of Rio de Janeiro, respectivamente em 1862 e 1863, e revolucionaram a prática bancária fluminense, disseminando o uso do cheque.
O London and Brazilian Bank não se restringiu ao Rio de Janeiro abrindo filiais em Recife e Porto Alegre. A do nordeste visava dar suporte financeiro às companhias londrinas de exportação e importação que negociavam com açúcar e algodão. A do sul estava ligada diretamente aos interesses das firmas britânicas que atuavam nos negócios de exportação e de importação de carne e dos frigoríficos ingleses que atuavam na região.
Comentando a presença destes estabelecimentos no Rio de Janeiro, Maria Bárbara Levy argumenta que “não eram filiais de bancos ou casas bancárias da Inglaterra, mas associações de grandes comerciantes que negociavam com o Brasil e viam nos negócios financeiros perspectivas de expandir seus negócios no Brasil. Não representavam a alta finança européia, mas reuniam empresários acostumados a lidar com o comércio exterior brasileiro, com o objetivo de colocar estas instituições a serviço de suas tradings”.
Além dos ingleses, alemães, franceses, portugueses e italianos abriram bancos no Rio de Janeiro. Enquanto o Banque Bresiliènne Française e o Banco Alemão Brasileiro apoiavam os investidores de seus países no Brasil, as agências do Banco do Minho e do Banco de Napoli prestavam serviços preferencialmente aos imigrantes portugueses e italianos que moravam na cidade e desejavam remeter suas economias para os seus países de origem.
No período compreendido entre os anos de 1866 a 1875, a Província do Rio de Janeiro passou a contar com a presença do Banco Commercial do Rio de Janeiro, fundado em 1866, e do Banco do Commércio, organizado em 1875.
Em 1888, a abolição da escravatura e a disseminação do trabalho assalariado aumentaram a demanda de moeda, deflagrando uma nova crise de liquidez na praça do Rio de Janeiro. A princípio, o Império brasileiro teve a intenção de autorizar a emissão de notas bancárias privadas, lastreadas em ouro ou em títulos da dívida pública, mas acabou desistindo e optando em vincular às emissões ao lastro metálico. O Banco Nacional do Brasil, o Banco do Comércio e o Banco de São Paulo tornaram- se emissores, mas somente o Banco Nacional do Brasil conseguiu exercer os direitos conferidos pela lei, beneficiado com a contratação de um empréstimo na Inglaterra e com a alta dos preços do café.
Com o fim da monarquia, a crise de liquidez que abalava os mercados de crédito do Rio de Janeiro, e de outras partes do país, tornou-se um problema da República que visando uma solução adotou uma política de crédito expansionista que deu origem a um dos mais fortes movimentos especulativos da história da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, trazendo inquietações à província fluminense: o principal centro financeiro do país.
Ao assumir o ministério da fazenda da República Rui Barbosa, um dos porta-vozes dos interesses industriais no Brasil, realizou a última tentativa de estabilizar a moeda no Brasil, a partir do receituário da escola papelista, assinando um decreto responsável pela criação de bancos emissores nas regiões norte, centro e sul do país. A região do Centro teve como sede o Rio de Janeiro. Além deste incluía os estados de São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Paraná e Santa Catarina. De um total de emissão de 450 mil contos de réis, a região do Centro recebeu o dobro da região Sul sendo contemplada com 200 mil contos de réis, ou seja, um pouco menos da metade do total de notas autorizadas pelo Ministério.
Os banco escolhido como emissor no Rio de Janeiro foi o Banco dos Estados Unidos do Brasil que, em 1890, sofreu um processo de fusão com o Banco Nacional dando origem ao Banco da República dos Estados Unidos do Brasil. Este último, colocou seus bilhetes em circulação e chegou a ser mais importante do que o Banco do Brasil.
A pluralidade emissora deflagrou uma crise financeira levando o governo a intervir no sistema bancário através da fusão do Banco do Brasil com o Banco da República dos Estados Unidos do Brasil. Deste processo resultou o aparecimento do Banco da República do Brasil que passou a ter o monopólio sobre a emissão de notas bancárias.
No período de 1889 até 1892, o aumento da liquidez provocado pela expansão de moeda teve um duplo efeito. De um lado, o crédito ficou mais barato, estimulando o lado real da economia. De outro, ocasionou uma inflação, seguida de um movimento especulativo na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro que teve início com ações dos bancos, valorizadas pelo crescimento dos empréstimos bancários. A especulação acabou por envolver ações de outras companhias, sobretudo, dos ramos de seguros e de transportes.
A crise especulativa se estendeu até 1893, quando a Bolsa mostrou sinais de queda do volume de negócios. Para o Rio de Janeiro, a euforia do crédito possibilitou o crescimento das atividades industriais e de serviços, pois a cidade era um local privilegiado, dotado de um porto, do maior mercado consumidor do país, das sedes do Banco do Brasil da Bolsa de Valores, além de bancos privados nacionais e estrangeiros.
Apesar do movimento especulativo ter chegado ao fim, a crise financeira prolongou-se até 1906. As tentativas de estabilização econômica, ortodoxas e mais flexíveis, empreendidas nos governos de Prudente de Morais, Campos Sales e Rodrigues Alves tiveram em comum o retorno das tentativas de adotar no país o padrão-ouro. Intencionalmente ou não, contribuíram para deflagrar uma crise bancária, marcada por fusões e incorporações de casas bancárias que quase liquidaram o Banco do Brasil, reorganizado em 1905 e serviram de barreira ao crescimento dos bancos.
Em 1910, o Brasil republicano permanecia com o mesmo problema que fora apontado no Império por Souza Franco: o reduzido número de estabelecimentos bancários. A nação possuía 21 bancos comerciais, sendo 5 estrangeiros e 16 nacionais.
Figura: Agência do Banco de Irineu Evangelista de Souza (Barão de Mauá), quase inteiramente destruída durante a guerra do Uruguai (1865). |
CRONOLOGIA
1808 - O Brasil passou a ser a sede da Coroa Portuguesa. Em 12 de outubro de 1808, através de um alvará do príncipe regente D. João, foi criado o Banco do Brasil. O capital da instituição seria constituído de 1.200 ações de um conto de réis cada uma. O lançamento público destinava-se à subscrição por grandes negociantes ou pessoas abastadas.
1809 - Em janeiro de 1809, D. João buscou apoio junto aos governadores das Capitanias, determinando que buscassem acionistas para o Banco do Brasil. O Banco do Brasil, instalado em prédio da antiga Rua Direita, esquina da Rua de São Pedro, iniciou suas atividades em 11 de dezembro de 1809.
1812 - Apesar do esforço para que se buscassem acionistas para o Banco do Brasil desde 1809, em fins de 1812, somente 126 ações haviam sido subscritas.
1817 - Nove anos após a fundação, encerrou-se a oferta pública de ações do Banco do Brasil, completando-se o capital de 1.200 contos de réis. O lançamento das ações do Banco do Brasil foi a primeira e mais longa das operações desse tipo no mercado brasileiro de capitais.
1819 - Em 1819, D. João VI determinou a construção de uma sede para a Bolsa do Rio de Janeiro. Esta foi mais uma das sólidas vinculações do Banco do Brasil com o nascente mercado de capitais do País. O Banco financiou integralmente a construção da primeira Bolsa brasileira: no balanço de 1821 constava uma rubrica referente ao custo do empreendimento, no valor de cento e sessenta e oito contos, trezentos e cinqüenta e seis mil, quatrocentos e trinta e três réis.
1821 - Em 25 de abril de 1821, D. João VI e a Corte retornaram a Portugal, levando os recursos depositados no Banco, já em crise devido à sua profunda vinculação com os interesses da Coroa.
1822 - Em 7 de setembro, D. Pedro I declara a independência do Brasil. O apoio do Banco foi decisivo para que as autoridades da época custeassem escolas e hospitais e equipassem os navios que minaram as últimas resistências lusitanas e asseguraram a Independência.
1833 - O Banco do Brasil foi exaurido por saques da Corte Portuguesa em seu retorno a Lisboa, por descalabro administrativo e desmandos financeiros durante o 1º Reinado. Findo o prazo de duração, estabelecido em 20 anos, e sob intensa oposição política, foi finalmente liquidado em 1833.
Em 8 de outubro, foi promulgada pela Assembléia e sancionada pela Regência, Lei que visava coibir definitivamente a desordem financeira que então se instaurara no País, fixando novo padrão monetário, gerando novas fontes de renda e restabelecendo o Banco do Brasil. No entanto, ocorre a falta de concorrência à subscrição pública de parte do capital estipulado para o novo estabelecimento emissor. Esta Lei é considerada a primeira iniciativa para restabelecer os principais conceitos e objetivos de caráter nacional do Banco do Brasil de 1808.
1838 - Fundação do Banco Comercial do Rio de Janeiro, em 10 de dezembro, por François Ignace Ratton.
1851 a 1893
1851 - Em 21 de agosto, no Rio de Janeiro, Irineu Evangelista de Souza, que viria a ser Barão e Visconde de Mauá, criou uma nova instituição denominada Banco do Brasil. Como antes, também nascida de um lançamento público, dessa vez com um capital de 10.000 contos de réis. Esse valor era considerado elevado para a época e o mais vultuoso entre os das sociedades existentes na América Latina. Nesse ressurgimento do Banco há uma forte carga simbólica de suas ligações permanentes com o mercado de capitais. As reuniões preparatórias e a assembléia de constituição se realizaram no salão da Bolsa do Rio de Janeiro.
1853 - O Banco do Brasil de Mauá é incorporado ao Comercial do Rio de Janeiro, por uma determinação legislativa liderada pelo Visconde de Itaboraí, considerado o fundador do Banco de hoje. Essa fusão propiciou um aumento de capital para 30.000 contos de réis na instituição. A fusão também foi responsável pela conversão dos bancos emissores das províncias em caixas filiais do novo BB. Cerca de 53% das ações foram atribuídos aos acionistas dos bancos que se uniram e 47% distribuídos ao público na capital do País e nas províncias. O lançamento foi um grande sucesso.
1854 - O novo BB iniciou suas operações sem intervenção do governo na condução das operações comerciais, restabelecendo os principais conceitos e objetivos de caráter nacional do Banco do Brasil de 1808. Em 19 de abril de 1854, a Diretoria do Banco resolveu que, para nomeação de novos empregados, “se abrissem concursos para se escolherem os mais idôneos e preencherem-se assim as vagas dos lugares de escriturários”.
1857 - Com a Reforma Bancária de 1857, bancos de emissão, criados através de simples decretos executivos, foram instalados em algumas províncias do Brasil.
1860 - Em 22 de agosto de 1860, foi promulgada a Lei nº 1.083, de Reforma Bancária, que restringia a circulação monetária mediante a emissão restrita dos bancos sobre a base de metais preciosos neles existentes. Tal lei representava uma cautelosa reação à proposta de pluralidade de fontes emissoras.
1863 - O Banco do Brasil transformou-se, em 1863, no único órgão emissor do território nacional. O Banco, no entanto, nunca sanou o problema estrutural de insuficiência de fundo disponível para garantir o volume de emissão necessário aos financiamentos exigidos pelo desenvolvimento econômico. E foi em situação de depauperamento que se viu atingido pelo impacto devastador da crise de 1864.
1864 - Com o fechamento inesperado em 10 de setembro de 1864, da Casa Souto, espalhou-se o pânico em toda a cidade do Rio de Janeiro, provocando a corrida de credores e depositantes aos estabelecimentos bancários. O Banco do Brasil esteve no epicentro desse terremoto econômico, pois havia adiantado recursos àquela casa, ultrapassando os limites do socorro tecnicamente possível. Pela manhã, Alves Souto consultou um diretor do Banco, no sentido de obter mais 900 contos de réis. A resposta teria sido que era inviável, e melhor seria se a Casa Souto encerrasse suas atividades. A notícia correu e o Banco do Brasil passou a ser encarado como responsável pelo cataclismo. Desordem e agitação perduraram uma semana. Em 17 de setembro, o Governo Imperial decretou a suspensão por 60 dias de todos os vencimentos, prorrogando-os por igual período. Além disso, deu curso forçado às cédulas emitidas pelo Banco do Brasil, evitando as falências em cascata, tranqüilizando o mercado financeiro e permitindo a posterior recuperação da economia.
1865 - As principais conseqüências da Casa Souto foram as falências e concordatas que ocorreram na praça do Rio de Janeiro até o fim de março de 1865. Houve também queda do movimento comercial, baixa do câmbio e dos valores dos imóveis, decesso das cotações das ações de companhias, inclusive das ações do Banco do Brasil, elevação do preço da moeda de ouro e aumento extraordinário da circulação fiduciária.
1866 - Com a Lei nº 1.349, cessava a faculdade de emissão do Banco do Brasil, que se transformou num instituto de depósitos, descontos e de empréstimos sobre hipotecas. O mais poderoso determinante da Lei foi a requisição insaciável de recursos, em espécies metálicas, para custeio da Guerra do Paraguai, de que resultou a alienação do Estado de toda a sua reserva metálica.
1880 - Em 7 de maio, com a presença do Imperador Pedro II, foi lançada a pedra fundamental da nova sede da Bolsa do Rio de Janeiro, também financiada pelo Banco do Brasil. O prédio só veio a ser inaugurado em 1906.
1888 - A partir do final dos anos 80, o BB passou a destacar-se como instituição de fomento econômico. Para a agricultura, destinou as primeiras linhas de crédito em 1888, utilizadas no recrutamento de imigrantes europeus para assentamento em lavouras de café, então sob o impacto da libertação da mão-de-obra escrava.
1889 - Com a proclamação da República, em 1889, o Banco do Brasil foi chamado a cooperar na gestão financeira do novo regime político e se destacou como agente saneador das finanças, abaladas pela crise do fim da Monarquia. Em 18 de setembro, foi autorizado por decreto o funcionamento de uma nova instituição financeira emissora, o Banco Nacional do Brasil.
1890 - O Decreto n° 109, de 30 de janeiro autorizou o funcionamento e aprovou os estatutos do Banco dos Estados Unidos do Brasil, também uma instituição emissora. Em 7 de dezembro, o Decreto n° 1.154 autorizou a fusão do Banco Nacional do Brasil com o Banco dos Estados Unidos do Brasil, formando o Banco da República dos Estados Unidos do Brasil.
1892 - Em 17 de dezembro, o Presidente da República baixou o decreto n° 1.167, em que autorizou a fusão do Banco do Brasil com o Banco da República dos Estados Unidos do Brasil, desde que a decidissem, por maioria de votos, as respectivas assembléias de acionistas.
1893 - Em fevereiro, as assembléias de acionistas aprovaram a união do Banco do Brasil com o Banco da República dos Estados Unidos do Brasil criando o Banco da República do Brasil, que ficou sendo a única entidade emissora de moeda na área da Capital Federal. Esse privilégio cessou quatro anos depois, quando a capacidade de emissão passou a ser exclusividade do Tesouro Nacional. A palavra República permaneceu no nome do Banco até 1906, quando ele retomou sua denominação histórica de Banco do Brasil.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Banco do Brasil foi o primeiro banco em território do Império Português. Foi criado por Alvará de 12 de outubro de 1808, pelo então Príncipe-regente Dom João de Bragança , por sugestão do Conde de Linhares, Rodrigo de Sousa Coutinho, num conjunto de ações que visavam a criação de indústrias manufatureiras no Brasil, incluindo isenções de impostos para importação de matérias-primas e de exportação de produtos industrializados. Instalou-se inicialmente na rua Direita, esquina com rua de São Pedro, no Rio de Janeiro, com 1 mil e 200 contos de réis de capital, iniciando as suas atividades a 11 de dezembro de 1809. Foi o quarto banco emissor do mundo, depois do Banco da Suécia (1668), Banco da Inglaterra (1694) e Banco da França (1800). Funcionando como uma espécie de banco central misto, de depósitos, descontos e emissão, dotado ainda do privilégio da venda dos produtos de que a Coroa Portuguesa tinha o seu monopólio: pau-brasil, diamantes, marfim e urzela. Forçado a emitir papel-moeda conversível sem o devido lastro (ouro), no intuito de custear as despesas da família Real, ficou desfalcado de seus fundos, com o saque de vultosa quantia, por ocasião do retorno de D. João VI e sua comitiva para Portugal. Em seguida, novamente obrigado a emitir para a consolidação da Independência, foi o Banco acusado de ter contribuído para a má situação financeira do país. Por lei de 23 de setembro de 1829, foi ordenada a liquidação do primeiro Banco do Brasil.
Durante o Império (1822-1889), depois de uma liquidação que encerrou suas atividades em 1833, Irineu Evangelista de Sousa (futuro barão e visconde de Mauá), criou em 1851 uma nova instituição denominada Banco do Brasil. Como antes, essa também nascida de um lançamento público, dessa vez com um capital de dez mil contos de réis. Esse valor era considerado elevado para a época e o mais vultoso entre os das sociedades existentes na América Latina. Nesse segundo Banco do Brasil houve uma forte carga simbólica de suas ligações permanentes com o mercado de capitais.
Em 1853, por iniciativa do Ministro Joaquim José Rodrigues Torres, o visconde de Itaboraí (considerado o fundador do atual Banco), foi determinado, pela lei de 5 de julho, a criação do novo Banco do Brasil, através da fusão do Banco do Brasil de Mauá com o Banco Comercial do Rio de Janeiro (fundado em 1838), com exclusividade na emissão do papel-moeda. Em 1866, devido a uma crise inflacionária, foi cassada a exclusividade na emissão do papel-moeda, operando apenas com depósitos, descontos e empréstimos hipotecários. Em 1893, veio a fundir-se com Banco da República dos Estados Unidos do Brasil, passando a se chamar de Banco da República do Brasil. As primeiras linhas de crédito rural do Banco do Brasil datam da década de 1890 do século XIX.
Por força do Decreto nº 1.455, de 30 de dezembro de 1905, volta a ter o seu nome tradicional, como é conhecido até hoje, com a reabertura em 3 de julho de 1906.
No início, desde a sua fundação, seu propósito era responder à crescente demanda por capital que a intensificação do comércio passava a exigir, após a abertura dos portos às nações amigas. O BB foi o primeiro passo para instituir um sistema financeiro no país e estabelecer condições monetárias e de crédito para o desenvolvimento do comércio. Instalado em prédio da antiga Rua Direita, no Rio de Janeiro, o BB tornou-se o quarto banco emissor no mundo, depois do Banco da Suécia (1668), da Inglaterra (1694) e da França (1800).
Em seus 200 anos de história, o BB atuou como importante instituição de fomento ao desenvolvimento da economia nacional. Em 1819, financiou a construção da primeira bolsa de valores do Brasil. Com o fim da escravidão (1888), abriu as primeiras linhas de crédito para agricultura. Inaugurou sua segunda agência em Manaus (1908), para financiar a produção de borracha, que se tornava o segundo item mais importante da pauta de exportação brasileira. Em 1937, criou sua carteira de Crédito Agrícola e em 1953, a Carteira de Comércio Exterior. Até 1964, exerceu a função de Banco comercial e Central.
O Banco do Brasil chega aos 200 anos como líder de mercado, com mais de 46 milhões de clientes, R$ 416 bilhões em ativos, 90 mil funcionários, com uma carteira de crédito de mais de R$ 200 bilhões e mais de 15 mil pontos de atendimento. A marca Banco do Brasil é líder absoluta no segmento bancário, ocupa a primeira colocação na Pesquisa Top of Mind, desde 1992, e é reconhecida pelo Instituto Nacional da Proteção Intelectual como marca de auto-renome. Está tão presente na vida dos brasileiros, que hoje toda a comunicação da Empresa é assinada apenas com a marca-símbolo, reconhecida por 97% da população.
FIM