A Casa da Moeda de Pernambuco

A Casa da Moeda da Bahia foi transferida para o Rio de Janeiro em 1698, em obediência à Carta Régia de 12 de janeiro desse ano. Em 1700 foi novamente removida, desta vez para Pernambuco, iniciando suas atividades em 13 de outubro de 1700, cunhando moedas de ouro e prata, usando a letra monetária “P”.
Por Carta Régia de 31 de janeiro de 1702, determinou o Rei o encerramento das atividades da Casa em Pernambuco, retornando ao Rio de Janeiro em 12 de outubro desse ano.
A Casa da Moeda de Pernambuco estivera alojada em Recife, no prédio da antiga Oficina Monetária de Recunhagem, pertencente a Antônio Fernandes de Matos, que a reformou e colocou à disposição do governo.

A seguir, vêem-se alguns interessantes textos de documentos, cartas e ofícios que tramitaram entre as autoridades envolvidas no procedimento de abertura da Casa da Moeda de Pernambuco:
Resolução tomada no ano de 1700 para que se levantasse Casa da Moeda na Capitania de Pernambuco.Manuel de Souza, & c. Por Joseph Ribeiro Rangel haver de vir para o Reino de se acabar o lavor do dinheiro nessa Capitania, e ter resoluto que a Casa da Moeda passe para Pernambuco. Me pareceu encarregarvos particularmente o cuidado da Casa da Moeda de Pernambuco por se necessitar mais de vós na falta do dito Joseph Ribeiro Rangel. Escrita em Lisboa a 20 de janeiro de 1700.
Rei
Dom João de Lancastro
Carta para D. Fernando Martins Mascarenhas de Lancastro, governador de Pernambuco, sobre Manuel de Souza, ensaiador da Casa da Moeda, servir como Juiz dela.Meu Primo e Senhor. Suposto havia remetido ao Ouvidor dessa Capitania as Instruções que havia de guardar como Superintendente e Juiz da Casa da Moeda para que Sua Majestade, que Deus o guarde, o havia nomeado; contudo agora me apresenta Manuel de Souza cartas de Sua Majestade, e do Secretário de Estado, mais modernas por que o dito Senhor lhe encarrega a ele todo o peso da Casa da Moeda, que pende do ofício de Juiz dela, e ensaiador, que já foi nesta cidade, e na do Rio de Janeiro, à vista do que se atendendo, que o Ouvidor assim pelas ocupações do seu cargo, não poderia fazer a contínua assistência, que deve fazer o Juiz da Casa da Moeda, como pela falta de experiência nesse negócio, que é de tantas consequências de que resultaria não se fazer bem o serviço de Vossa Majestade o que devia ser o motivo, por que de próximo se encarrega o peso da dita Casa ao dito Manuel de Souza; me pareceu conveniente, que o dito Ouvidor sirva somente de Seperintendente da Casa da Moeda, ocupação que o não diverte de assistir às do seu cargo, nem tem tantas consequências, e o dito Manuel de Souza servirá de Juiz da Casa, como Sua Majestade ordena, e ensaiador e Vossa Senhoria que zela o serviço do dito Senhor à vista do referido assim o insinuará ao dito Ouvidor, pois o meu intento não é outro, mais que ficar Sua Majestade bem servido, e esses povos satisfeitos: e desta resolução dou conta a Sua Majestade nesta frota. Deus guarde a Vossa Senhoria muitos anos.
Bahia, 23 de agosto de 1700
Dom João de Lancastro
Registro da carta de Sua Majestade para o Provedor-mor mandar vender a prata do sobejo da Casa da Moeda e informar sobre o exercício dela e pagar o ordenado que importava o aluguel da casa.
Francisco Lamberto. Eu El-Rei vos envio muito saudar. O Chanceler da Relação desses Estado me deu conta por carta de 10 de junho do ano passado, em como allém do rendimento que teve a Casa da Moeda dessa cidade em dinheiro se achava nela, em espécie, nove marcos, três onças uma oitava e meia de prata que tudo estava entregue ao tesoureiro geral desse Estado e as casas metidas nos próprios, e pareceu-me ordenar-vos mandeis ai vender a dita prata sobeja e o procedido dela se remeta a este Reino, e quanto a casa que serviu da moeda informeis sobre o exercício que mais convém dar a esta casa para que se aplique onde tenha mais préstimo, lembrando-vos que esta casa foi tirada ao espingardeiro que limpa as armas, a quem se deve por ordenado esta vivenda e desde que se lhe tirou se paga a Fazenda Real o ordenado que importaria o aluguel da casa.
Escrita em Lisboa a 8 de janeiro de 1700. Rei. Conde de Alvor. Presidente. Para o Provedor-mor da Fazenda do Estado do Brasil. Registre-se. 
Bahia 8 de maio de 1700. Francisco Lamberto Matias Miranda de Oliveira o registrou em o dia do mês e ano e entregou ao próprio ao mesmo Provedor-mor, Joaquim Antunes Morais.
Trecho da carta para Manuel da Costa Ribeiro, Ouvidor de Pernambuco, sobre servir de Superintendente da Casa da Moeda, e Manuel de Souza de Juiz e ensaiador dela.Sem embargo do que remetí a Vossa Mercê as instruções que me pareceram necessárias, além do Regimento da Casa da Moeda, que Sua Majestade, que Deus guarde manda para essa cidade, que também a Vossa Mercê remetí, para exercer as ocupações de Superintendente, e Juiz da dita casa, como o dito Senhor ordena: agora de presente, vendo cartas de Sua Majestade, e Secretário de Estado, mais modernas, que me presentou Manuel de Souza, em que o dito Senhor lhe encarrega todo o peso da Casa da Moeda, que pende do ofício de Juiz dela (em que o nomeia) e ensaiador que já foi nesta cidade e na do Rio de Janeiro, à vista do que atendendo às ditas ordens, e serem posteriores às de Vossa Mercê; e considerando que Vossa Mercê com as ocupações do seu cargo, não poderá fazer na Casa da Moeda aquela contínua assistência que deve ter o Juiz dela, do que e de Vossa Mercê não ter aquelas experiências necessárias nesta matéria, que não é da sua profissão, poderá resultar algum inconveniente ao bom serviço de Sua Majestade, e à satisfação desses Povos, (que é a que somente atendo), e na pessoa de dito Manuel de Souza, concorrerem as partes e experiências necessárias, e o bom procedimento com que se tem havido que devia ser motivo para o dito Senhor tomar a nova resolução, de lhe encarregar o peso da Casa da Moeda: Me pareceu dizer a Vossa Mercê que o dito Manuel de Souza, há de servir de Juiz da dita Casa, e ensaiador: e que Vossa Mercê ficará somente exercendo a ocupação de Superintendente, guardando inviolavelmente as instruções que lhe remetí tocantes somente à dita ocupação...
Carta para o capitão Antônio Fernandes de Matos.Antonio Fernandes de Matos. O Governador dessa Capitania me deu conta por carta de 26 de junho deste ano do zelo com que vos oferecestes a fazer a Vossa custa a Casa da Moeda nessa Capitania em que havieis gastado mais de nove mil cruzados pela obra desta com tal perfeição que excede a que se fizeram na Bahia e Rio de Janeiro e que da mesma maneira tinheis feito um telheiro para a fábrica do trem da artilharia também à vossa custa, sem que minha fazenda concorresse com coisa alguma, nem os povos dessa Capitania para as tais obras e pareceu-me agradecer-vos por estas o bom serviço que me fizestes em fazer a vossa custa estas obras e que me fica em lembrança para folgar de nos fazer a mercê, quando tratardes dos vossos acrescentamentos. 
Escrita em Lisboa a 24 de setembro de 1700.
Rei

O estabelecimento onde foi instalada a Casa da Moeda de Pernambuco, foi construído por um certo Capitão Antônio Fernandes de Matos, cedida por ele ao Rei para servir como Casa da Moeda. Era na ocasião ocupada pelo “espingardeiro”, o sujeito responsável pela manutenção das armas em Recife (que segundo os cronistas da época, não duravam muito, devido ao clima muito úmido e a “maresia” que corroia tudo). O espingardeiro morava lá como recompensa pelos seus préstimos ao Rei durante a expulsão dos holandeses. O próprio Rei numa dessas cartas (vide página anterior) manda que, com a sobra da prata da cunhagem, pague-se os aluguéis ao homem.

Naquele tempo a rua chamava-se “Maria Rodrigues”. Ao redor da oficina, com o tempo, casas foram se acumulando, e a rua passou a ser chamada pela população de “Rua da Moeda”, e assim é conhecida até hoje. Como a princípio era uma casa residencial (cedida ao “espingardeiro”) é de se supor que não se tratava de uma construção grandiosa.

Todavia, nas décadas de 50/60 o bairro do Recife foi bastante descaracterizado, e o lado esquerdo da rua foi totalmente modificado, com a demolição de algumas antigas casas coloniais e restauração de outras, o que acabou por modernizá-las a ponto de tirar todo seu fascínio dos tempos da Colônia.
Bibliografia: Salazar, Guilherme de Alencastro, As Oficinas Monetárias e as Primeiras Casas da Moeda no Brasil.

Nas duas imagens, a partir de cima, vêem-se a Rua da Moeda fotografada na primeira metade do século XX e a mesma rua em foto recente. Num desses casarios, provavelmente funcionou a Casa da Moeda de Pernambuco. Ao fundo vê-se o Paço da Alfândega (o prédio amarelo, hoje um shopping center). As casas foram sendo modificadas com o tempo, o que dificulta a identificação de qual delas foi sede da Casa da Moeda. As do lado esquerdo da rua, principalmente, foram “reformadas” e totalmente descaracterizadas.

Casa da Moeda de Pernambuco - (13/10/1700 a 12/10/1702)

O objetivo de se criar uma Casa da Moeda no Recife, deveu-se à escassez de numerário que estava ocasionando decadência ao comércio local. A Provisão de 20 de maio de 1672, expedida pelo Conselho Ultramarino decidiu instalar uma Oficina de recunhagem, destinada a alterar as características das moedas oriundas de outras localidades. Através do Alvará do Conde de Óbidos, Vice- Rei do Brasil de 7 de julho de 1673, essa Oficina passou a recunhar as moedas de ouro e prata então correntes naquela Capitania, alterando-lhes o valor. Além disso, determinou, ainda, através da Provisão Régia de 23 de março de 1679 que as patacas em curso na Capitania, fossem transformadas, no prazo de um mês. Para execução desses trabalhos, foi adaptada, na Vila do Recife, em julho de 1673, um imóvel situado na rua, que posteriormente, veio a ser denominada Rua da Moeda.

A Casa da Moeda de Pernambuco iniciou suas atividades em 13 de Outubro de 1700 tendo cunhado, com a letra monetária “P”, as moedas de ouro e prata a seguir:

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Após a reformulação do valor circulante daquela Capitania, a manutenção de um estabelecimento de cunhagem de moedas não se fazia mais necessário. Dessa forma, através da Carta Régia de 31 de Janeiro de 1702, ficou determinado que a Casa da Moeda de Pernambuco encerrasse suas atividades, transferindo seus equipamentos e Oficiais para o Rio de Janeiro, devido às descobertas de ouro em Minas Gerais e da necessidade de lavrá-lo em moeda corrente. Oficialmente, a Casa da Moeda de Pernambuco encerrou suas atividades em 12 de outubro de 1702.
A Casa da Moeda, que em 1698 viera transferida da Bahia para o Rio de Janeiro, foi removida, em 1700, para Pernambuco. Iniciou suas atividades em 13 de outubro de 1700, cunhando moedas de ouro e prata, usando a letra monetária “P”. Por Carta Régia de 31 de janeiro de 1702, determinou o Rei o encerramento das atividades da Casa em Pernambuco, a qual em 12 de outubro desse ano retornou ao Rio de Janeiro. A Casa da Moeda de Pernambuco estivera alojada em Recife, no prédio da antiga Oficina Monetária de Recunhagem, pertencente a Antônio Fernandes de Matos, que a reformou e colocou à disposição do governo.

Figura: D. PEDRO II (1683 - 1706) - Casa da Moeda de Pernambuco, 4000 réis 1702 PPPP. Data emendada de 1701 / ouro 916,7 ‰, Ø: 27,00 mm, W: 8,16 gr. PETRUS•II•D•G•PORTVGAL•REX•. Anv.: Escudo das armas reais, encimado por coroa real, ladeado pelo valor 4000 à esquerda e 3 florões dispostos em vertical, à direita. Rev.: ET•BRASILIÆ•DOMINUS•ANNO. Data 1702. Cruz vaza de São Jorge, circundada por arcos e ornamentos letra monetária PPPP-Pernambuco.

Nota: Antônio Fernandes de Matos foi um mestre de obras, arquiteto e empresário português do Brasil colonial. Foi um dos responsáveis pelo desenvolvimento urbano ocorrido no Recife no final do século XVII.
Nascido provavelmente em Moreira do Lima, no norte de Portugal, a primeira notícia da presença de Matos na Capitania de Pernambuco data de 1671 e se refere à construção de umas casas na rua do Açougue no Recife. Apesar de ser de origem humilde, Matos rapidamente transformou-se num rico “mascate” (alcunha dada aos comerciantes portugueses do Recife, naquela época), controlando as matérias-primas que utilizava nas suas atividades construtivas.
Como mestre de obras e empresário, Antônio Fernandes de Matos teve um papel muito importante na reconstrução do Recife após a expulsão dos holandeses, custeando do próprio bolso muitas obras. Em 1684-1685, com autorização do governador D. João de Sousa, financiou e levantou a Fortaleza da Madre de Deus e São Pedro num banco de areia localizado ao sul da Ilha do Recife. Essa fortaleza, já desaparecida, foi o único empreendimento de Matos na arquitetura militar e valeu-lhe a patente de capitão e um soldo. Outras obras levantadas por Matos incluem o Quartel da guarnição do Recife (1693) e a nova molhe da cidade (1696-1699) e o estabelecimento onde foi instalada a Casa da Moeda de Pernambuco. Matos foi um personagem importante no movimento construtivo que povoou o Recife de grandiosas edificações religiosas na segunda metade do século XVII. Entre 1680 e 1683, levantou na antiga Porta da Terra (Lantpoort) da cidade fortificada da época holandesa o Arco e Capela do Bom Jesus da Cruz. Construiu ainda vários conventos: a Igreja e Hospício da Madre de Deus (1679-1683), a Igreja e Convento do Carmo (1685-1701) e o Colégio de Jesus e Igreja de Nossa Senhora do Ó (começado em 1686). O Convento da Madre de Deus, da Congregação de São Filipe Néri, foi fundado num terreno no istmo do Recife doado pelo próprio Matos e sua mulher, D. Paula Monteiro. Toda essa atividade construtiva no campo religioso e militar valeu-lhe uma carta de recomendação do Padre Antônio Vieira, datada de 1691, para ser apresentada na corte de Lisboa.
Em 1695, Matos entrou para a Ordem Terceira de São Francisco do Recife, uma das mais exclusivas confrarias coloniais, cujos membros eram em grande parte mascates abastados. Foi escolhido como mestre de obras da capela dos terceiros, atualmente conhecida como Capela Dourada, e iniciou sua construção em 1696. Já em 1697, a Capela foi inaugurada e iniciaram-se as obras de decoração interna, também coordenadas por Matos, que fariam desta uma das mais importantes obras de arte da época colonial brasileira.